
Eu nunca imaginei que viveria algo assim, mas aqui estou, pronta para contar o que aconteceu na semana passada.
Tudo começou alguns meses antes, quando Jack — meu marido há oito anos — passou a agir de um jeito esquisito.
A gente já não era recém-casado, porém nosso casamento parecia firme. Ou pelo menos era o que eu acreditava.
No início, as mudanças no humor dele foram quase imperceptíveis.
Jack sempre foi cheio de projetos, só que, de repente, começou a falar de “estilos de vida alternativos”, como se tivesse encontrado uma nova filosofia.
“Você sabia”, comentou ele certa noite, rolando o celular, “que tem gente que adota formas bem diferentes de viver? Faz a gente pensar no que funciona e no que não funciona.”
“Tipo o quê?”, perguntei.

“Ah, sei lá”, respondeu sem firmeza. “Só… maneiras de deixar a vida mais fácil.”
Eu presumi que fosse algo inocente, tipo minimalismo ou aquelas modas ecológicas.
O problema é que Jack costuma mergulhar de cabeça em cada novidade. Uma vez foi carpintaria, outra jurou que abriria um food truck.
No fim, todas essas fases passavam. Achei que dessa vez seria igual.

Depois vieram os comentários sutis.
“Não seria ótimo se tivéssemos uma ajudinha extra?”, soltou ele numa noite em que eu dobrava roupas.
“Como assim?”, perguntei, encarando-o.
“Ah, nada”, deu de ombros. “Você vive ocupada. Não acha que seria bom ter alguém para dividir o peso das coisas?”
“Você está falando de faxina?”, brinquei.
Ele riu baixinho, mas não respondeu. O tom sério dele me deixou desconfortável pela primeira vez.

Mais ou menos nessa época, notei que ele grudara no telefone. Levava para todo lado. Literalmente. Cozinha, banheiro e até a cama.
Ficava ali, deslizando a tela e rindo sozinho. Quando eu perguntava do que era tanta graça, ele dizia: “Só uns vídeos do Instagram.”
De início, não levei a mal. Mas algo naquele hábito repentino começou a me inquietar. Quem muda assim de uma hora para outra?
Então decidi conversar com ele.

Numa noite, quando ele saiu do banheiro com o celular na mão, eu finalmente perguntei: “Jack, está tudo bem?”
Ele congelou por um segundo.
“Claro”, disse com um sorriso. “Só estou tentando pensar em como melhorar nossa vida. Não esquenta.”
Era para ter me tranquilizado, mas aconteceu o contrário. “Melhorar nossa vida” soou como um código para algo que eu não queria decifrar.

Alguns dias depois, ele lançou outra pergunta que me deu um arrepio.
“Você acha que eu sou honesto com você?”, perguntou como quem comenta o tempo.
“Honesto?”, repeti. “Acho que sim… por quê?”
“Por nada”, respondeu rápido. “Só acho que a honestidade é a base de qualquer casamento. Você concorda?”
“Claro”, falei, estreitando os olhos. “Mas de onde vem isso? Por que essa conversa?”
“Não é nada demais”, ele riu. “Só penso que precisamos falar do futuro… de como tornar tudo melhor para nós dois.”

“Tá bom”, respondi, procurando um jeito de mudar de assunto. “Preciso pegar umas coisas na loja hoje. Quer ir comigo?”
“Claro”, ele disse.
Eu esperava que ele largasse aquele tema estranho. Mas, olhando agora, vejo que aquela conversa era só o começo da tempestade.
Vamos para a semana passada. Jack chegou do trabalho animado demais. Eu estava na cozinha cortando legumes para o jantar quando a porta se abriu de supetão.

Ergui os olhos esperando o habitual “Oi, amor”. Em vez disso, ele entrou com uma jovem grudada no seu calcanhar.
“Amelia”, disse num tom leve demais, “esta é Claire.”
Larguei a faca, sem entender.
Quem era aquela mulher? Amiga minha? Nunca tinha ouvido esse nome na vida.
“Oi, Claire”, falei. “Posso ajudar com alguma coisa?”
Ela não respondeu. Só olhava para Jack, como se aguardasse instruções.
“O que está acontecendo, Jack?”, perguntei, já impaciente.
Eu sabia que havia algo errado.

“Amelia…” ele começou. “Claire vai ser minha segunda esposa.”
Segunda esposa? Por um instante, achei que fosse uma piada.
“Boa, Jack”, ri. “Cadê a câmera escondida?”
Mas o rosto dele não mudou. Ele estava falando sério. Sério de verdade.
“Você está brincando”, eu disse.
“Isso não pode ser verdade, né?”
Meu olhar foi dele para Claire, que me encarava como se eu fosse a exagerada da história.

“Não”, respondeu Jack. “Olha, eu sei que soa fora do comum, mas é prático. Claire é trabalhadora. Ela pode ajudar a cozinhar, limpar, cuidar da casa… Assim tudo fica mais leve. E é melhor do que eu ter uma amante escondida, não é? Pelo menos eu estou sendo sincero.”
Fiquei ali, tentando encaixar aquelas palavras na realidade.
Ele queria colocar outra mulher no nosso lar como se fosse trocar um móvel. E ainda esperava que eu aplaudisse a “transparência”? Sério mesmo?

Enquanto isso, Claire permanecia atrás dele, evitando meus olhos. Dava para notar que preferia estar em qualquer outro lugar.
Jack continuava falando, defendendo que aquilo era “o melhor para todo mundo”. E foi aí que me veio uma ideia cruel.
Cruzei os braços e esperei ele terminar. Quando, enfim, calou a boca, eu sorri doce.
“Tudo bem”, falei. “Você pode ter uma segunda esposa. Mas existe uma regra.”
Os olhos dele brilharam. “Claro! O que você quiser! Qual regra?”

“Eu também vou ter um segundo marido”, declarei, bem tranquila.
“Combinado?”
Ele me olhou como se eu tivesse dito a coisa mais absurda do planeta.
“Se-segundo marido?”, gaguejou. “Como assim?”
“Ué, se você tem direito a outro cônjuge, por que eu não teria? Pense, Jack: duas rendas, alguém para sair comigo quando você estiver ocupado ou sem vontade… um homem que realmente me traga flores. Isso é justo, não é?”

“Isso… isso não é a mesma coisa!”, ele resmungou. “Você está sendo ridícula, Amelia!”
“Ridícula eu?”, levantei a sobrancelha. “Você aparece com uma desconhecida e quer que eu a receba de braços abertos, mas a ideia de eu ter a mesma liberdade te parece absurda? Que lógica interessante, Jack.”
Claire travou. Os olhos dela saltavam de um para o outro, como quem entrou na sala errada. Se antes estava nervosa, agora parecia a segundos de fugir.

O rosto de Jack ficou vermelho enquanto ele tentava justificar o plano.
“É diferente”, insistiu. “Homem com duas esposas… isso existe em algumas culturas. Mas mulher com dois maridos? Ninguém jamais ouviu falar disso.”
Soltei um riso curto. “Ah, então você virou especialista em tradição? Engraçado, não lembro de você seguir nenhuma outra prática cultural… por que só essa, justamente essa?”
“Amelia, seja séria”, ele elevou a voz. “Você não pode ter outro marido. Isso nem existe!”

“Bem, Jack, se você quer viver de forma ‘tradicional’, eu também vou escolher as minhas tradições”, respondi, dando de ombros. “Mas deixa eu ser clara: você não terá segunda esposa enquanto eu não tiver segundo marido. Essa é a minha regra. Aceita ou não.”
Ele ficou parado, de olhos arregalados. Eu sabia que ele queria gritar, mas até ele entendia que estava sendo ilógico.
Sem dizer mais nada, ele virou para Claire. “Vai para casa. Depois a gente resolve isso.”
Ela nem discutiu. Pegou a bolsa e quase correu porta afora, sem se despedir do homem que achava que ia se casar com ela.
Naquela noite, Jack tentou de todo jeito me convencer de que eu estava exagerando. “Você não fala sério”, repetia, andando pela sala. “Só quer me dar uma lição. Vamos conversar como adultos.”
“É exatamente o que estamos fazendo”, respondi fria. “Eu fui clara. Se você quer Claire, eu quero outro marido. Simples assim.”
De manhã, ele já estava diferente. Entrou na cozinha com a cabeça baixa.
“Eu pensei melhor”, disse constrangido. “Talvez essa história de segunda esposa não tenha sido uma boa ideia.”

“Talvez?”, repeti.
“Ok. Foi uma ideia horrível. Vamos esquecer que isso aconteceu, tá?”
Esquecer? Ha! Boa tentativa, Jack.
“Já passou do ponto de apagar tudo”, falei. “Ontem à noite, eu criei um perfil num aplicativo de namoro e já recebi dezenas de mensagens de homens que parecem muito mais interessados em ser meu segundo marido do que eu imaginava.”
“O que você quer dizer com isso?”, ele perguntou, com a voz tremendo.
“Chega, Jack. Acabou”, respondi.

No dia seguinte, arrumei minhas coisas e fui morar com uma amiga.
Jack continuou me ligando, mas eu não atendia. Mandou mensagens, implorando perdão.
Pouco depois entrei com o pedido de divórcio e, pelo que ouvi, até Claire parou de retornar as ligações dele.
**Pelo visto, ele deveria ter pensado duas vezes antes de propor uma “solução” tão conveniente.**
